sábado, 28 de junho de 2014

50 tons de autismo


- Seu filho é autista? Ah, mas, apesar de autistas terem suas limitações, são muito inteligentes, né? Verdadeiros gênios! Já viu aquele filme 'Rain Main'?

Não sei quantas vezes eu já tive essa conversa. Aí vem a minha explicação de que nem todos são assim. Que enquanto alguns autistas têm vida normal, apenas com uma limitação para compreender metáforas e ironias, ou uma ansiedade exacerbada, que dificulta que estejam no meio de multidões, outros têm que ser protegidos de si mesmos devido a comportamentos de auto-agressão, ou precisam usar fraldas mesmo depois de adultos (lembrando que a intervenção precoce é sempre a melhor maneira de ajudar os autistas a evoluírem dentro do espectro). Ah, e tem os gênios, claro.

Eu já estive neste lugar. Não sabia nada de autismo até ser mãe do Felipe. Achava que todos os autistas ficavam olhando para o alto e balançando o corpo. E não me importo nem um pouco de explicar que existem 50, 100, infinitos tons de autismo. E que meu filho talvez esteja ali no centro dessa escala.

Há famílias que chamam o autismo de bênção, e exaltam as características singulares de seus filhos. Outras que nunca se recuperam da perda da criança idealizada. É óbvio que a diferença, aí, está no grau de autismo. E eu? Bom, estou longe de achar que o transtorno é só um traço da personalidade de Felipe...

Não queria que meu filho tivesse que passar por tantas dificuldades. Adoraria levá-lo para se divertir numa festa infantil sem que ele ficasse nervoso com a confusão, que ele pudesse ir ao cinema sem que o som alto e as imagens rápidas e sucessivas o deixassem em pânico, que ele conseguisse brincar com as outras crianças sem que elas se afastassem porque não entendem seu jeito de ser.

Queria que ele pudesse me dizer qual é sua cor preferida e qual dos super-poderes dos heróis ele acha mais legal. E, enquanto a maioria das mães reclamam dos apelos consumistas de seus filhos, adoraria que o meu filho pedisse por um brinquedo carérrimo no seu aniversário. Porque, na verdade, é muito difícil descobrir algum que ele se interesse.

Queria, mais do que tudo, entender o que Felipe quer me dizer no auge de suas crises de raiva e frustração.Tenho momentos de desânimo, de impaciência... Muitos! E se existisse uma pílula milagrosa que fizesse desaparecer esses obstáculos da vida do meu filho, eu daria a ele.

Mas... (tem que ter um mas!) também estou longe de achar que ter um filho autista é uma lástima. E, como virou moda fazer listas, aí vai o meu Top 10 de como é bom ser mãe do Felipe:

1) O sorriso do Felipe é qualquer coisa de extraordinário. Todo o seu rosto se ilumina.
2) Felipe rejeita totalmente o senso comum de que "autistas se isolam" e adora estar perto de gente! Seus abraços de urso deixam os estranhos um pouco desconcertados no início... mas depois eles se apaixonam!
3) De uns tempos pra cá, Felipe deu pra balançar o corpo timidamente quando ouve uma música. Own... é muito fofo.
4) Ou ele cantarola alguma canção que nem sempre conseguimos descobrir qual é, mas não importa: é a coisa mais linda!
5) As gargalhadas de Felipe quando fingimos que vamos mordê-lo ou quando o pai brinca de jogá-lo na cama são contagiantes!
6) Quando está dormindo, Felipe parece um anjinho, dá vontade de ficar enchendo de beijos! (tá boooom, qualquer criança dormindo parece um anjinho...)
7) Felipe metido a independente é divertidíssimo! Vai na geladeira, pega prato no escorredor, talher na gaveta... e se serve sozinho!! A gente encontra depois os rastros...
8) Ele enche o saco do Rafa, como qualquer irmão, hehehehe... E morre de rir quando o caçula se cansa e parte com tudo pra cima dele!
9) O esforço de Felipe pra falar uma ou duas palavrinhas é digno de admiração. Não é fácil pra ele, mas ele está tentando!
10) Meu filho é lindooooooo!!!

Já viram um palhacinho banguela mais bonito do que esse?